terça-feira, 3 de julho de 2012

Filosofias Educacionais na Educação dos Surdos (Parte 2)

De acordo com Viana (1996, p. 84):

O canal auditivo do surdo é compensado pelo superdesenvolvimento do canal visual. Diante dessa realidade, exigir que o surdo aprenda a linguagem pela linguagem verbal é castrador e desrespeitoso para com a pessoa, o ser humano que é diferente e, portanto, necessitam de veículos de informações diferentes, mecanismos facilitadores do seu aprendizado.

Desta forma, pode-se compreender que a aquisição da linguagem e o desenvolvimento cognitivo do deficiente auditivo estão diretamente ligado ao apoio visual que receba, associado a todos os outros estímulos; entretanto, o apoio visual cinestésico exerce maior influencia no desenvolvimento da sua linguagem.

A partir deste pressuposto, conclui-se que, na criança surda, a aprendizagem para ser igual a da criança ouvinte, necessita de abordagens específicas. O efeito será igual ao do ouvinte, mas o tempo gasto será muito maior, mesmo que essa criança seja estimulada desde os primeiros meses.

A filosofia da comunicação total tem como principal preocupação os processos comunicativos entre surdos e surdos e entre surdos e ouvintes.

Os profissionais que seguem a comunicação total percebem o surdo como uma pessoa, e a surdez como uma marca que repercute nas relações sociais e no desenvolvimento afetivo e cognitivo dessa pessoa.

A filosofia da comunicação total acredita que somente o aprendizado da língua oral não assegura pleno desenvolvimento da criança surda, esta filosofia defende a utilização de qualquer recurso lingüístico, seja a língua de sinais, a linguagem oral ou códigos manuais, para facilitar a comunicação com as pessoas surdas.

A Comunicação Total, como o próprio nome diz, privilegia a comunicação e a integração e não apenas a língua. O aprendizado de uma língua não é o objetivo maior da comunicação total.

Esta forma de comunicação é denominada de bimodalismo, pois é um dos recursos utilizados no processo de aquisição da linguagem pela criança e na facilitação da comunicação entre surdos e ouvintes.

A comunicação total vê o surdo como diferente em relação ao ouvinte. Faz utilização de todos os recursos para estabelecer uma comunicação e contato com o surdo, fazendo utilização da escrita, sinais e a voz, ocorrendo a leitura do movimento labial.

Todo esse processo ocorre sem envolver o surdo adulto. Neste caso, a Comunicação Total não deixa de enfatizar a língua na modalidade oral como sendo a mais importante, é um tipo de bimodalismo que usa simultaneamente sinais para auxiliar visualmente aprendizado da língua alvo, que é a língua oral.

As pessoas que têm habilidades completas em duas ou mais línguas são definidas de bilíngües, podendo incluir neste conceito, pessoas que têm habilidades para falar em uma língua e escrita em outra, pessoas que falam duas línguas em variados graus de complexidade, mas que não podem ler e escrever estas línguas.

Desta forma, acredita-se que o Bilingüismo tem como pressuposto básico que o surdo deve ser bilíngüe, ou seja, deve adquirir como língua materna à língua de sinais, que é considerada a língua natural dos surdos e, como segunda língua a língua oficial de seu país.

Assim, sabe-se que o conceito mais importante que a filosofia Bilíngüe traz é de que os surdos formam uma comunidade, com cultura e língua próprias. A noção de que o surdo deve, a todo custo, tentar aprender a modalidade oral da língua para poder se aproximar o máximo possível do padrão de normalidade é rejeitada por esta filosofia.

Esta proposta educacional não privilegia uma língua, mas quer dar direitos e condições ao indivíduo surdo de poder utilizar duas línguas; portanto, não se trata de negação, mas de respeito; o indivíduo escolherá a língua que irá utilizar em cada situação lingüística em que se encontrar. Esta proposta leva em consideração as características dos próprios surdos; incluindo a opinião dos surdos adultos com relação ao processo educacional da criança surda.

Através de estudos feitos pelo Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), acredita-se que o bilingüismo admite que o surdo vive numa situação bilíngüe, ou seja, reconhece o fato de que os indivíduos surdos são locutores naturais de uma língua adaptada às suas capacidades de expressão e compreensão: a Língua Brasileira de Sinais – (LIBRAS). Ao mesmo tempo, estes indivíduos fazem parte de uma comunidade majoritária que usa uma língua oral (auditiva – verbal) para se comunicar com o meio e esta língua oral possui seu equivalente escrito: a língua escrita.

A educação dos surdos constitui um sério problema e muitos caminhos têm sido seguidos na busca de uma solução. Durante muito tempo, pensou-se que a solução seria que os surdos freqüentassem escolas regulares, pois, assim, estariam inseridos na comunidade e aprenderiam os conteúdos indicados para sua faixa etária. Porém, muitas pesquisas e estudos mostram que a inserção pura e simples do surdo nas classes regulares não leva aos resultados esperados, tornando os anos de escolarização enfadonhos e muitas vezes danosos ao sujeito surdo.

Conforme Skliar (1999, p. 09):

A educação bilíngüe para surdos, como qualquer projeto/proposta educacional, não pode ser neutra nem opaca. Porém, falta a consistência política para entender a educação aos surdos como uma prática de direitos humanos concernentes aos surdos; a coerência ideológica para discutir as assimetrias do poder e do saber entre surdos e ouvintes; a análise da natureza epistemológica das representações colonialistas sobre a surdez e os surdos.

A educação bilíngüe para surdos pode também, estar fixada ao discurso da deficiência, se as suas estratégias pedagógicas e os seus discursos permanecem no âmbito da educação especial. A separação entre educação especial e educação de surdos é imprescindível para que a educação bilíngüe desenvolva uma certa profundidade política.

O objetivo de uma educação bilíngüe da criança surda é dar-lhe uma situação de desenvolvimento da linguagem dentro de um clima de comunicação efetiva, porém, sabe-se que para chegar a este objetivo, a criança passará por um desenvolvimento da linguagem através da língua de sinais – (LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais), pois permitirá a criança surda o restabelecimento desta comunidade efetiva.

Desta maneira, acredita-se que o objetivo é dar à criança surda a possibilidade de obter sucesso em suas trocas verbais, com prazer. Permitindo a esta criança a chance de se fazer compreender de uma forma eficaz através da língua de sinais (LIBRAS), a criança surda descobre o que fazemos e quando falamos.

Não se pode negar a condição bilíngüe do surdo; comunidade ouvinte e comunidade surda, e para isso devemos dar-lhe a oportunidade de comunicação dentro das modalidades comunicativas utilizadas nessas duas comunidades: a oral e a gestual.

Assim, acredita-se que o Bilingüismo concebe os surdos como diferentes e não mais excluídos da sociedade, ou tendo que se moldar a esta. Há o reconhecimento da sua língua natural, e há a existência de uma identidade surda. Porém, o conceito mais importante que a filosofia bilíngüe traz é de que os surdos formam uma comunidade, com cultura e língua próprias.

O bilingüismo visa um trabalho escolar como sendo feito em duas línguas, sendo que com privilégios diferentes. Língua de sinais como primeira língua e a língua da comunidade ouvinte como sendo segunda língua. LIBRAS (L1) – língua materna. PORTUGUÊS (L2) – língua estrangeira

Com essa forma de vê o surdo, o bilingüismo acredita na atuação efetiva do surdo adulto no processo de educação das crianças surdas, capacitando a pessoa surda para utilização de duas línguas no cotidiano escolar e no cotidiano da vida. Assim, acredita que os surdos possuem uma cultura e que pode sentir-se à vontade nas duas comunidades.

Sabe-se que o conceito que se faz de uma pessoa pode afetar a maneira como é tratada, vista e até mesmo, como ser educada.

A visão de valores intrínsecos guiará a maneira como vivemos e agimos em relação às outras pessoas. O modelo ideal para sociedade enfatiza muito a dimensão física do ser humano, ou seja, a pessoa ideal seria uma pessoa perfeitamente saudável e com traços físicos intactos.

As pessoas que escutam e que, por sua vez, são chamadas de ouvintes, têm em sua crença de que ser ouvinte é melhor do que ser surdo, pois a visão é que ser surdo é ter uma perda de uma habilidade, ou seja, perda do canal auditivo, que é um dos mecanismos por onde passa as informações e compreensão de mundo. Mas, cabe ressaltar que esta é uma visão de uma sociedade majoritária, que tem como exigência um padrão "perfeito" de beleza do indivíduo, sendo que nenhum ser humano é exatamente igual a outro.

Por esta forma de pensar, compreende-se que o que diferencia o surdo do ouvinte é a forma de comunicação, em que o surdo usa a comunicação viso-espacial e o ouvinte usa a comunicação oral, tratando-se apenas de uma diferença.

Desta maneira, ser surdo é saber que pode falar com as mãos e aprender uma língua oral-auditiva, é conviver com pessoas que, em um universo de trabalhos, deparam-se com pessoas que estão percebendo o mundo, principalmente, pela visão, e isso faz com que eles sejam diferentes e não necessariamente, diferentes.

Na visão de Perlin (1998, p. 42) "A identidade surda é politicamente estabelecida dentro de uma representação que contém mais diretamente a assimetria dessa identidade. O sujeito incorpora em maior ou menor grau, a representação da mesma".

A existência de uma cultura surda ajuda a construir uma identidade das pessoas surdas. Desta maneira, falar em cultura surda significa também trazer à lembrança uma questão identitária. Um surdo estará mais ou menos próximo da cultura surda a depender da identidade que assume dentro da sociedade. De acordo com a visão de Perlin (1998), pode-se identificar características próprias para cada tipo de identidades dos surdos definindo-as como: Identidades surdas flutuantes, Identidades surdas inconformadas, Identidades surdas híbridas e Identidades surdas.

a) Identidades surdas flutuantes (ambiente do surdo colonizado ou socialmente capaz).

Pode ser identificada como os surdos subordinados ao oralismo, que vivem sobre uma ideologia dominante. É um tipo de identidade em que o surdo terá o ouvinte como modelo de identidade, negando sua cultura surda para se apropriar da cultura ouvinte.

A representação da surdez, neste ambiente é estereotipada, ou seja, é feio ser surdo, melhor é ser ouvinte, assim o surdo esconde sua comunicação em LIBRAS e não têm compromisso com a comunidade surda. É uma identidade surda reprimida, porque é evitada, negada, escondida, ou porque é resultado de estereótipos.

b) Identidades surdas inconformadas (socialmente incapaz)

As identidades surdas inconformadas são um outro tipo que pode ser representada diante da identidade ouvinte. São surdos que não conseguem usar a comunicação oral nem a sinalizada, se refugiando na incapacidade. São aprisionados na representação dos ouvintes que vêem os surdos como deficiente. Estes vivem sob uma situação de inércia e revolta. Neste caso, a falta de informação sobre o surdo na família é total, geralmente predominando a opinião médica.

c) Identidades surdas de transição

Esse tipo de identidade faz parte da situação de surdos que foram mantidos sob o domínio oralista e que passam gradativamente para a comunicação surda. Transição é o termo utilizado para narrar o momento de passagem do mundo ouvinte para o mundo da identidade surda. Se a aquisição da cultura surda não se dá na infância, a maioria dos surdos precisa passar por esse momento de transição, já que grande parte dos surdos são filhos de ouvintes. Nesse caso, entra num processo de reconstrução da identidade, passagem da comunicação visual/oral para a comunicação visual/sinalizada.

d) Identidades surdas híbridas

Se fazem presentes entre os surdos que nasceram ouvintes, e que com o tempo se tornaram surdos. Conhecem a língua falada e usam-na, mas captam a comunicação de forma visual. O surdo que nasce ouvinte sempre terá presente as duas línguas, mas sua identidade terá de ir ao encontro da identidade surda, sob o risco de isolamento.

e) Identidades surdas

É caracterizada pela passagem para o mundo visual, onde a consciência surda de ser definitivamente diferente e de necessitar de recursos de comunicação. A partir das novas experiências compartilhadas na comunidade surda, narra-se de maneira diferente e começam a representar-se como capazes e como sujeitos culturais, e as novas identidades que surgem são questionadas e articuladas, nesse ambiente.

Assim, falar de identidade surda é analisar o momento de transição pelo qual os surdos passam, dentro dos espaços culturais, pois as identidades surdas e culturais são estruturas descentralizadas, que se estruturam no deslocamento das origens.

Como afirma Perlin (1998, p. 121) "A identidade surda é incômoda na sociedade, mesmo assim ela precisa ser assumida. Ela é um passo para assegurar a subjetividade de cidadania e esvaziar o individualismo agressivo da exclusão".

Assim, a partir deste pressuposto o surdo tem o direito de ter uma representação de sua identidade, colocando-se como sujeito que tem direitos e deveres a cumprir, que possui uma forma de comunicar-se e que sua comunicação se dá através do canal da visão.

Colocando-se desta maneira, o surdo estará na posição de construção de sua identidade, analisando que ele é diferente em relação às outras pessoas, mas que essa diferença não o coloca em uma posição menos favorável.